sábado, 4 de agosto de 2012

Jogo de sombras.

Não sei você, mas eu adorava brincar com sombras quando eu era menor. Eu ficava em frente à uma lanterna (concordo que brincar em frente de velas seria mais charmoso, mas a) Eu não tive muitas oportunidades de brincar com velas e b) Eu mal consigo andar sem tropeçar. Eu com qualquer coisa que envolva fogo é uma potencial ameaça) e fazia formas simples: um coelho, um cachorro, uma pomba. Aquilo me distraía durante alguns minutos.

Durante aqueles minutos, eu fingia ver coisas que não estavam ali, mas que somente suas ideias já serviam para me divertir.

E provavelmente agora você já sabe onde estou indo - se é que algum dia quis ir à algum lugar.



Eu cresci e meu quarto escuro mudou. De ipsis litteris, meu quarto escuro se transformou numa conjunção descoordenada de coisas que tinham de ser feitas, metas que têm de ser cumpridas, sonhos e vontades que têm de ser colocados de lado, amizades e faltas que têm de se esquecer e fingir que nunca aconteceram, apenas para que este quarto escuro formado por elas não te traguem. É aquele momento no qual o quarto escuro se forma ao redor de você e ameaça te tragar.

Resolvi acender uma lanterna. "Que raios você quer dizer com isso, Erik?". Nada. Mas se eu quisesse ser instigante, eu poderia dizer que quero dizer alguma coisa. Se eu quisesse ser misterioso, poderia dizer que talvez algo, talvez nada. Se quisesse confundi-lo, poderia dizer que algo que eu disse nada quis dizer se não o que eu disse - e que fique o dito pelo não dito. Se eu quisesse ser incompleto poderia dizer que...

O fato é que uma lanterna foi acesa. Uma lanterna pode vir na forma de estudos, amores, projetos (ou, quem sabe, um blog bobo). Qualquer coisa que seja o suficiente para lhe tirar do torpor da escuridão. Qualquer coisa que seja capaz de lhe despertar de uma noite sem estrelas.

Qualquer coisa que te jogue uma luz.

Uma vez que o feixe de luz é lançado numa direção, brincar com ele e manipula-lo são estorvos necessários para que seus efeitos sejam alcançados. A luz, por si só, ilumina e desafoga, mas não distrai. Você pode ter uma lanterna na sua mão, mas, caramba, você ainda sabe que está mergulhado num quarto escuro.

Então você escreve textos, pinta quadros, dança balé, qualquer coisa que lance uma sombra a sua frente. Algo que seja diferente o suficiente para lhe dar uma distração, te mostrar que a vida é mais que o status quo, mais que o casa-trabalho-escola, mais que nascer-crescer-reproduzir-morrer - mas nada definido, nada que realmente lhe tire do quarto escuro.

Brincar com sombras é fingir que você está em um lugar melhor do que o lugar que você está agora, e ignorar o fato de que você só está naquele lugar agora porque lhe falta a coragem de sair dali. É comodismo. É procrastinar. É covardia (não se sinta ofendido. Todos os adjetivos, antes de serem dirigidos a quem cabem, passam pela minha boca, e pelos meus ouvidos, e eu os recebo de braços abertos como velhos amigos feitos de navalha).

Brincar de sombras é saber que você é capaz de simplesmente levantar do chão e sair daquele lugar, ou PELO AMOR DE DEUS, acender uma lâmpada - ainda assim, é tão mais fácil me contentar com o escuro e brincar de sombras...

É muito melhor não correr riscos e apenas contemplar as incertezas. Só que não.

As sombras pueris nunca serão nada mais do que imagens incertas de coisas inexistentes. Talvez seja a hora de desligar a lanterna e acender o sol.

Está terminando de anoitecer (lá fora ou aqui dentro?), e talvez seja hora de finalmente eu acender a luz.


2 comentários:

  1. Sombras no quarto são um modo de esquecer os problemas lá fora, e fingir que podemos ser felizes vivendo apenas conosco... FINGIR

    Por mais que o mundo lá fora nos traga dor, precisamos batalhar para encontrar caminhos, luzes, luzes que façam refletir nosso potencial, e claro, uma luz que faça nosso coração brilhar.

    E ah, quando eu era pequeno eu imaginava mil coisas com sombras =P

    Manda muito!

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